sexta-feira, setembro 29, 2006

Remendos...

Quero fechar a porta. Quero despejar a raiva e a angústia que não tiram o dedo da campainha. Começa a ser doloroso ser senhoria de um mundo de vazios que me prendem àquilo que quero esquecer.
Mas tu não deixas. Não sais do caminho. Continuas entre mim e entre aquilo que resta de mim.
Não consigo pensar. É incrível como consegues baralhar cada pedaço daquilo que tenho dentro de mim.
Fazes-me querer tanto tudo e ao mesmo tempo querer um universo cheio de nada.

Cheio de vento... cheio de bolas de sabão. Cheio daquilo que constrói os nossos sonhos e se solta no céu em gestos suaves e pausados.
Tenho esta mania de querer continuar a ser criança eternamente. Mesmo sabendo que continuarei a ser sempre alguém que não uma criança.
Gosto desta ingenuidade aparente que me dá o prazer de sentir a vida com novos abraços a cada momento. Mesmo sabendo que a realidade está apenas a um piscar de olhos de distância. A um toque da minha pele...

Dou por mim a recordar emoções contraditórias que um dia tomaram conta do balão que balançava no meu coração. E sinto-o rebentar mais uma vez... Discretamente. Como se quisesse que ninguém notasse no rasgão que maldosamente lhe fizeram. Impiedosamente.
Às vezes tenho pena do meu balão. Cheio de remendos.
Coso e volto a encher. E volto a coser... e a encher... Porque continuo a acreditar que um dia hei-de dar a volta ao mundo com o meu balão.
E aquele sorriso de criança volta a crescer no rubor dos meus lábios...

E então, de repente, a porta bate. Uma brisa sussurra-me ao pescoço e percorre cada arrepio do meu corpo.
Hoje sei que vou adormecer e sonhar com o sorriso que espalharei por esse céu pintado com bolas de neve. Com o companheiro das horas tristes solitárias, dos diálogos intermináveis com alguém que penso ser eu, mas não estou certa de ser.
Com a fénix que renasce das lágrimas e transforma a dor num doce bolo de morangos...

Amanhã. Hoje. Daqui a bocado. Ou terá sido ontem?
Esqueci-me.


[acordei...]

sábado, setembro 23, 2006

Hoje.

Hoje preciso não parar de escrever. Hoje preciso esquecer tudo aquilo que alguma vez vi, tudo aquilo que consegui sentir até aqui. Hoje preciso agarrar na borracha que fui construindo com os erros que fui cometendo e apagar o grande borrão que sem pedir licença, hoje se instalou na minha alma. Perder-me num mundo que vou deixando de reconhecer. Perder o controlo de tudo aquilo que até aqui pensei, ingénua e erradamente, controlar.

Escrever sem parar, escrever sem pensar, escrever sem querer, querer tudo aquilo que escrever...

Hoje preciso que as palavras saiam da ponta dos meus dedos como as gotas da chuva que resmunga lá fora, preciso sentir que voo por entre as letras que deixo soltar, que vou a todo o lado sem ir de facto a lado nenhum. Libertar tudo aquilo que tenho cá dentro e correr com todas as minhas forças para não me deixar alcançar. Fintar as desventuras que teimam em me agarrar.

Não quero ter medo. Estou tão farta de ter medo... tão farta de sentir o gosto da vida fugir-me por entre as lágrimas que me desgastam o doce da pele e que eu tento em vão voltar a conquistar. Tão farta de achar que a fraqueza voltará a vencer, quando sei bem que só eu lhe posso dar forças pra vingar. Tão farta de estar farta...

Procuro e torno a procurar, pergunto e torno a perguntar, perdi-me e voltei a perder-me. Caminho lentamente, mas o tempo voa e foge nas asas da dor que hoje mandei embora. Aquela que me fez ter medo. Aquela de que me fartei. Aquela que resolvi não deixar mais entrar.

Nunca mais.

Hoje quero começar tudo de novo. Quero esquecer todas as marcas que as mágoas deixaram em mim, quero esfregar todas as nódoas negras que me arrasaram o coração, quero arrancar todas as crostas das feridas que me queimaram por dentro. Quero regressar a tudo aquilo que um dia consegui abraçar quando acreditava que o conseguiria fazer.

Hoje quero acreditar.

quarta-feira, setembro 20, 2006

às vezes...

1.38 da manhã.
As teclas não param de tocar; saltam por entre as palavras doces que dançam na boca dos personagens daquela série que te faz recordar...
Mas o barulho dos lençóis interrompe-te o pensamento. E o murmúrio de quem sonha com outros barulhos...

Às vezes gostas de ficar a olhar. Páras no tempo por um mero instante e agarras cada segundo como se nada mais restasse. Vês-te. Sentas-te na sala de cinema e assistes ao filme da tua vida.
Dás por ti a imaginar como será estar na pele de outra pessoa. Daquela que se senta ao teu lado. Daquela que passa por entre a luz da projecção. E daquela outra que come pipocas.
Como será a vida vista pelos olhos dela? Como será o mundo pensado pelos pensamentos dela? E a vida? Como será a vida sentida pelos sentimentos dela?
As perguntas seguem ao longo daquela linha que brilha, desenhada no alcatrão. E as respostas? Essas, nunca as saberás.
Há coisas que foram feitas para serem simplesmente questionadas, nunca respondidas. Mas tu teimas em não acreditar.

Outras vezes gostas de esquecer. Gostas de acreditar que um dia as coisas possam ser diferentes. Gostas de pensar que talvez consigas libertar-te dos pesadelos e agarrar um novo mundo de frente.
Gostas de ficar a imaginar como seria colorir aquela parede sem medo que em seguida vá lá alguém pintá-la de novo de branco... e tu tenhas que recomeçar tudo pela enésima vez...
Gostas de viver nessa tua ingenuidade sem fim, que adormece a teu lado à noite e que te acorda quando menos esperas, e por vezes onde nunca pensaste sequer que ela pudesse entrar.

Voltas a questionar-te. Voltas a questionar. Nem essa doçura meio naif te arranca das infinitas perguntas que insistem em passear no teu pensamento. Queimam-te por dentro, rasgam os últimos pedaços de tecido de felicidade que tens dentro de ti.
E ainda assim, não tens coragem de fechar o baú. E elas resistem e persistem nas voltas perfeitas que dão ao teu coração...


Ou será que és tu que insistes em lhes abrir a porta?